Protagonistas de histórias potentes, os alunos da professora Caroline Barbosa fizeram da escola um palco. Referências negras em literatura e teatro foram disparadores para que a turma refletisse sobre questões importantes da realidade em que estão imersos. O projeto Histórias ficcionais em busca de protagonismos reais: o teatro como lugar de fala, desenvolvido na Escola Municipal Dalva de Oliveira, no Rio de Janeiro/RJ, foi vencedor do XXI Prêmio Arte na Escola Cidadã, na categoria Ensino Fundamental 2.
Foi a partir da vontade dos alunos de falar sobre si e de se reconhecerem em narrativas reais que, com ouvidos muito atentos, a professora começou a buscar referências que melhor representassem a turma. Foi no Teatro Experimental do Negro dirigido, de Abdias do Nascimento, e nos livros escritos por Carolina Maria de Jesus, que a educadora encontrou um caminho potente para desenvolver narrativas de resgate e de valorização das histórias de seus estudantes.
A professora conta que, durante os jogos teatrais, a turma mostrava interesse crescente em falar sobre questões raciais. O interesse dos alunos ficou ainda mais evidente após a participação do Coletivo Panela Teatral na Semana da Consciência Negra da escola. Um espetáculo seguido de roda de conversa colocou a turma em contato com os artistas e a ação acendeu o debate sobre negritude e a importância de narrativas negras na arte e na escola. “Quando tenho uma demanda de estudantes que querem falar sobre a questão da negritude, eu não posso falar sobre isso sozinha. Então eu chamo coletivos, outros corpos, outras narrativas. Quando esses outros corpos entram na escola, os estudantes se reconhecem neles, e passam a acreditar mais em si próprios como sujeitos”.
“Eu tenho aprendido que fazer teatro na escola, fazer arte na escola, só se faz em coletivo, só se faz junto”. E esse foi um dos pensamentos norteadores do projeto: trabalhar vários protagonismos dentro da cena teatral para exercitar o olhar dos estudantes para si, enquanto indivíduos, e para o coletivo, enquanto potência criadora. A professora buscou também o suporte de outras disciplinas para aprofundar as questões sociais do tema. Na aula de História, com o professor Gilvan Irineu, os estudantes debateram assuntos como racismo e violência, as origens e os desdobramentos de temas tão presentes na sociedade brasileira, além de conhecer a história dos autores que estavam estudando no teatro.
Referências negras na literatura e na História nem sempre estão presentes na escola, de forma natural. Estudar essas personalidades, e o impacto positivo que tiveram na construção da negritude brasileira, contribuiu para que os alunos pudessem se perceber e enxergar novas possibilidades de criação a partir de suas experiências. “Eles estão cansados de saber que a realidade é violenta, porque eles vivem isso o dia todo. Mas quando a gente começa a conhecer quem é resistência e exaltar essas referências, a gente acaba acreditando na gente mesmo.”
Uma sala que estava parada, sem nenhuma utilidade, se tornou a Sala de Artes Cênicas. E, durante meses, abrigou os ensaios, as improvisações e os jogos teatrais da turma. Além de estudar as práticas teatrais e os autores negros, a turma estudou música, poesia, cenografia. O projeto, construído por muitas vozes, culminou em um espetáculo que teve a participação dos alunos em todo o processo: na construção da dramaturgia, da trilha sonora, dos cenários e do figurino. O espetáculo tomou conta da escola, e de outros territórios, com apresentações em festivais, bibliotecas e em outras escolas públicas. “Eu, como professora, já pensei em desistir várias vezes. E eles vêm e falam ‘a gente quer fazer, a gente quer falar, a gente quer viver a cenas!’”.